Por Marcel Moreno
Estava eu sentado em um banco de praça comendo um chocolate.
Coloquei o alimento de lado para me concentrar
em um livro. Estava um dia quente e particularmente chato. Uma pomba se
aproximou. Olhou para mim como quem não quer nada e emitiu o som que todos eles
emitem sem nem saber porque. - Gru gru gru. Eu concentrado no meu livro não dei
a mínima par a fome da pomba como se a fome e a vida alheia não fossem um
problema meu e nem fizesse parte do meu cotidiano. Ficamos ali desta forma por
alguns minutos, e eu distraído, quando de um salto, um lance, a pomba deu uma
bicada violenta e agarrou o chocolate. Eu que não iria deixar barato, agarrei
do outro lado do doce, em uma tentativa dramática de resgatar o meu bem, o meu
alimento. Assim travamos uma batalha, uma briga corporal quase como um
cabo-de-guerra, no qual eu lutava bravamente pelo que era meu e ela lutava pelo
seu intento. Eu gritava para ela soltar e que ela me devolvesse, que aquilo que
ela estava fazendo era roubo, totalmente contra a lei. Ela argumentava que eu
deveria ajudar quem mais precisava, que aquilo não poderia ser roubo, visto que
ela estava agindo com o coração, que certamente poderia ter mais, que eu
provavelmente já deveria ter mais. Entre troca de olhares raivosos e com medo,
com corações acelerados e sangue correndo como carros em uma grande avenida,
ela foi mais forte - não sei porque mas foi - ela arrancou o chocolate das
minhas mãos. Logo que soltei, o chocolate voou pelos ares, e ao cair, se
espalhou em segundos. Várias outras pombas apareceram e surrupiaram tudo o que
conseguiram. Em meio a sentimentos de ódio, medo e impotência, chamei a polícia.
Ela por sua vez pôs-se a chorar e a se perguntando se era crime roubar para
alimentar seus filhos. Se a prisão então seria seu castigo por essa investida,
investida de uma mãe desesperada, que vê seu filho doente, chorando por sua única
vontade, vontade que o faria talvez alcançar a única felicidade que ele teria
na vida, já que poderia não chegar a fase adulta.